terça-feira, 8 de maio de 2012

Inventário - Os livros de Carlos Dignez

O meu primeiro emprego  durava a madrugada toda. Os professores do glorioso E.E.S.G. Casimiro de Abreu a.k.a CECA do paulistano bairro de Vila Guilherme, me permitiam sair mais cedo. O Estado tinha abolido os uniformes e antes de pegar algum ônibus até o metrô no ponto da Maria Candida defronte ao bar onde uns anos depois eu, triste,  pediria uma cerveja de garrafa e veria Roberto Carlos e  Djavan dividirem o hit  A Ilha no especial do Rei, eu entregava meu guarda pó para o meu irmão caçula, o Ruy em outra classe. Eu tinha trocado o meu horário de estudo e só aparecia de manhã, depois de sair do trabalho por "exigência expressa" de duas pessoas.
Ele apareceu numa das madrugadas. Tinha desembarcado do Pará, Castanhal. Falava muito do pai, da mãe, da avó, dos amigos. Dos meus. Agitado, elétrico se auto proclamou mais tímido do que eu e só não ficava em silêncio por que senão o ambiente seria de um mutismo só. Pior, lia a alma e os gestos humanos como nenhum outro que eu tinha visto. Era parecido com o Lo Borges na capa do disco Via Lactea.
Um dia me viu escrevendo numa folha quis saber o que eu estava escrevendo, envergonhado disse que escrevia. E ele; também escrevo e passou a mostrar um produção enorme de textos. Eram textos que beiravam ao parnasianismo, barroco contra a minha economia de palavras e cenas. Enquanto minha escrita era de saudades de trens, terra, infãncia e de um vir a ser. A dele abria o peito para a abertura que o país vivia, ia a luta, brigava e amava e já estava longe no vir a ser. Nos familiariza com os poemas de Neruda, letras de  Gonzaguinha, Chico Buarque, Garcia Lorca.
Sedutor as mulheres começaram a aparecer em profusão nos textos. Sedutor foi despachado para longe de minha companhia nas madrugadas por inveja.
Fundou grupo de poesia, do qual só não participei por estar envolvido com outro. Editou jornais, produziu eventos culturais. Vivia intensamente a poesia que pregava.Quando publicou o primeiro livro me deu a honra de ver meu nome num livro e dividimos juntos um poema. Ele no estilo dele e eu ainda querendo ser letrista do Milton Nascimento. Sumiu nos vimos pouco desde então. Não sem antes de me deixar honrado por ter como epígrafe num dos livros um poema meu.Reapareceu em minha vida recentemente.
Daquele primeiro emprego carrego algumas lembranças e carinho fraternal por três pessoas. Nelson Brito, baixista do Golpe de Estado, Romão Robles Jr e ele Carlos Alberto que virou Dignez em homenagem a mãe.






o mais recente artigo dele no Jornal Cidade Aberta de Barretos.



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