sábado, 12 de março de 2011

Roda de Sábado - As vitórias da Beija-Flor

dorme espremido entre os vinis em casa, o dos sambas de enrêdo de 1976. quase não tem capa, o encarte sumiu, e as vozes dos intépretes só é reconhecida atrás de uma parede de chiados.
conheço de cor três dos sambas ali. o da Vila Isabel,"Invenção de Orfeu"(ilhado na imaginação/o poeta vai cantando/histórias tão sem histórias/de tristeza e alegria...), gravado simultânemente por Martinho da Vila no àlbum Rosa do povo, o samba da Em cima da Hora, o ótimo e clássico "Os sertões"(sertanejo é forte supera miséria sem fim/sertanejo homem forte dizia o poeta assim), que ouvi na voz do meu amigo Mário, num "esquenta goela", para a gravação de fita cassete. onde definitivamente me dei conta que o samba era bom mesmo.
o terceiro era de uma escola que eu nunca tinha ouvido falar. e que quando ganhou ouvi de meu tio Osmar, "é de uma escola de não sei onde". retrucado pelo tio Paulo, "fizeram um desfile bonito, parece". como é mesmo o nome ? Beija-Flor.
o samba era "Sonhar com rei dá leão"(sonhar com anjo, é borboleta/sem contemplação, sonhar com rei dá leão) e a tal Beija-Flor, "de não sei onde", apresentava para o mundo do samba três personagens à partir daquele ano, um quarto seria entronizado na vida carioca, por um outro viés.
a modela negra de cabelo raspado Pinah, que faria Príncipe Charles esquecer por um momento as botas de cano longo que trouxe para sua estada no Brasil, com medo das cobras, e seria envenenado por outro motivo, cambaleando diante da dama sorridente.
o intéprete dos sambas da escola desde então, um certo Neguinho da Beija-Flor, que introduziria, uma porção de cacos no canto, apresentaria a escola num bordão famoso e hoje usado até em propaganda, "Olha a Beija-Flor aí gente...", influenciando a nova gerações de intérpretes em contraponto ao canto prágmático de Jamelão e Haroldo Melodia, dividindo a avenida com outros cantores.
o carnavalesco Joãosinho Trinta. criticado pelo excesso de luxo em seus ênredos megalomaníacos e até censurado por outros e cunhou por conta das críticas a famosa frase;"Quem gosta de miséria é intelectual. O povo gosta de luxo".
o luxo da Beija-Flor tinha razão de ser e patrocínio. culpa do quarto personagem, na verdade uns, os irmãos, Abrãao David, homens do jogo de azar da Baixada Fluminense. não por acaso, o primeiro carnaval ganho pela escola trataria do tema do jogo do bicho.
jogo do bicho, que financiava muitas escolas, que viram nessa vitória da escola de Nilópolis, o deságuo para o jorrar do dinheiro. o carnaval do Rio conheceu o luxo. a Beija-flor seria campeã três vezes seguidas, 76/77/78.
quando Leonel Brizola, saído do exílio e eleito governador do Rio, pediu para Oscar Niemeyer desenhar a nova passarela do samba e colocar na boca brasileira a palavra "sambódromo", o luxo se fez mais presente. não era compatível um desfile mequetrefe diante de tal beleza arquitetônica. ademais a tv, a globo, com os direitos da transmissão, queria um espetáculo que prendesse o espectador na cadeira. para isso até seus atores passaram a destaques. e se Nilópolis era "não sei onde", muitos levados pelo presidente Boni, conheceram a baixada e o poder emergente na sociedade carioca dos Abrãao David. escolas como Portela, Vila Isabel, Império Serrano e Mangueira, padeceram e ainda padecem.
só nos anos 2000 a Beija-Flor voltaria a enfileirar carnavais seguidos Não sem antes, ver Mocidade Independente e Imperatriz Leopoldinense, também com patronos, inventarem o carnaval "técnico", a Beija-Flor aprendeu direitinho. a chance para as outras era um desfile emocional, coisa que aconteceu com a Vila Isabel em 1988 e a Mangueira com ênredos para Chico Buarque e Braguinha.
se o poder do bicheiros diminui só faltando mesmo uma "subida ao morro do alemão", do jogo do azar, a Beija-flor mantém laços firmes com a Globo, luxuoso e técnico seu desfile é teste até para a transmissão 3d, a participação em realitys da casa como o BBB onde a escola comparece todos os anos.
por isso assim que Ivo Meirelles e sua turma abandonaram o setor de apuração na ùltima quarta, podia-se ouvir antes do corte do som ambiente um refrão que já foi popular em outros tempos, "Rede Globo, o povo não é bobo !" e "Hey Globo vai tomar no c(*)!".
o desfile técnico e luxo em 3d, valem mais que as inovações de Meirelles sem o seu puxasaquismo com globais.





e não se esqueçam, apesar dos pesares. Rei é Rei sempre.

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