sábado, 18 de setembro de 2010

Roda de Sábado - Jimi Hendrix

"Eu vivia num quarto de espelhos
Tudo o que eu via era eu
Mas meu espírito me guiou e eu quebrei os espelhos
Todo o universo se abriu a minha frente" (*)





(...)

Em Chicago, Jimi contou as horas até ter um dia livre. Sabia onde queria ir: aos estúdios da Chess, foco irradiador do moderno blues, onde todos os seus ídolos gravavam, Muddy Waters, Willie Dixon, Bo Didley. Quando a folga pintou, ele pegou sua velha, velhíssima Fender e foi para lá. Não queria nada, sequer sonhava em gravar; um amigo de um amigo trabalhava como assistente técnico, tudo que ele sonhava era ficar por ali, no aquário, peruando, sacando, quem sabe se um deles, qualquer um , não ia entrar, mas ei, não é...quem é..."Ei cara, esse aí é o Muddy Waters mesmo ?".

(...)

"Quem é o garoto com a guitarra ?". Muddy
Jimi não sabia onde se meter, Muddy estendeu a mão larga, sentou-se. A conversa foi mais curta e mais longa que a com Albert King. Para Jimi durou uma eternidade. Muddy lhe contou uma história fascinante, terrível; a história de um garoto de vinte e um anos que saiu de uma plantação de tabaco nos anos 20 para tocar blues, gravou dois discos num quarto de hotel, compôs os versos mais apaixonados e tristes e belos, tocou dobro (violão característico do blues acústico, com cordas obrigatoriamente de aço), como ninguém ainda conseguiu tocar, amou muito, trepou demais, e morreu assasssinado aos vinte e seis anos, envenenado por uma bela mulher. Um garoto bonito, alto, pintoso, assim feito você Jimi, gostava de boas roupas, é, e lenços de seda também, bons chapéus, gastava tudo o que ganhava em bebida, roupa e mulher. Você conhece esse ? É dele: "quando eu morrer/ enterrem meu corpo na beira da estrada/ pra minha alma pegar um ônibus/ e viajar, aaa, ooh, oooh, o slide gemendo no braço da guitarra. Jimi não ousava falar, não ousava tocar - "Mas toque homem" - ele timidamente arriscando umas harmonias - "isso, bom" - e no fim da tarde, já noite fechada lá fora, em Chicago, o grande Muddy, olhando em seus olhos.
_ Eu conheci o garoto, conheci bem sim. Robert Johnson, era o nome. Sabe quem é ?
E Jimi cobrindo a boca com a mão, seu gesto automático de timidez e espanto.
_ Já lhe falaram que você se parece com alguém Jimi ? Pois se parece. Você se parece com ele.(*)



Aniversário de morte é o que há, 40 anos. Vamos fazer de conta que ele foi ali, pegou seu equipamento de paraquedista e está preparando um salto para nos impressionar de novo.
Sua aterrisagem será espetacular, entre nuvens purpuras e caindo e destruindo os castelos feitos de areia que insistem em se manter por aqui.
E se bem conheço espírito de negão ele já deve ter descido para ficar ao lado das irmãs Corrs, Sharon, Caroline e Andrea para ouvir quietinho o que elas fizeram com as pequenas asas de Ícaro dele. Para fazer um anjo sonhar.





(*) trechos extraídos do livro Jimi Hendrix, de Ana Maria Bahiana, Ed. Brasiliense 1984

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