segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Dia D - Drummond

O Sobrevivente


Impossível compor um poema a essa altura da evolução da humanidade.
Impossível escrever um poema - uma linha que seja - de verdadeira poesia.
O último trovador morreu em 1914.
Tinha um nome de ninguém se lembra mais.
Há máquinas terrivelmente complicadas para as necessidades mais simples.
Se quer fumar um charuto aperte um botão.
Paletós abotoam-se por eletricidade.
amor se faz pelo sem-fio.
Não precisa de estômago para digestão.

Um sábio declarou a O Jornal que ainda falta
muito para tingirmos um nível razoável de
cultura. Mas até lá, felizmente, estarei morto.

Os homens não melhoraram
e matam-se como percevejos.
Os percevejos heróicos renascem.
Inabitável, o mundo é cada vez mai habitado.
e se os olhos reaprendessem a chorar seria um segundo dilúvio.

(Desconfio que escrevi um poema)


escolhi com muita dúvida este poema acima para o post de hoje.
eram várias as opções. entre elas o poema abaixo.
dei uma passada lá na minha caixa de mensagens e li o presente que ganhei.
claro roubei a ideia na caruda, sem constrangimento.
alcina maria campos virou co-autora do post de hoje.
leiam a escolha dela.


ALÉM DA TERRA, ALÉM DO CÉU

Além da terra, além do céu
no trampolim do sem-fim das estrelas,
no rastros dos astros,
na magnólia das nebulosas.
Além, muito além do sistema solar
até onde alcançam o pensamento e o coração,
vamos!
vamos conjugar
o verbo fudamental essencial
o verbo transcendente, acima das gramáticas
e do medo e da moeda e da política,
o verbo sempreamar
o verbo pluriamar,
razão de ser e viver.

Carlos Drummond de Andrade

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