quarta-feira, 26 de outubro de 2011

O letrista do Milton, palavras para Mirna

para

mirna,

aquela hors councors

e hoje é aniversário do milton nascimento

no fim da rua que fui morar no bairro paulistano de vila guilherme, tinha um lixão. aos fins de tarde o cheiro chegava até o conjunto residencial da josé bernardo pinto, urubus sobrevoavam o local. no rádio um radialista de nome gil gomes contava o casos de crimes da cidade, na primeira semana vi um corpo na esquina da 12 de setembro, uns dias depois outro corpo no lixão, que estava se transformando em terreno mais inconstante, soltando bolhas de gás a cada passo que se dava e recuperando com líquido oriundo do lixo, a lagoa que era antes do precário aterramento. as relações de amizades ainda eram difíceis, a escola era muito longe, as pessoas pareciam mais individualistas e queriam briga por qualquer motivo, em disputas por espaço e afirmação. para quem tinha saído de uma cidade com cinco árvores para cada habitante, andando e sendo cumprimentado, com família e amigos em profusão, foi um choque. o silêncio que já era uma marca, se incorporou de vez. ainda sem vitrolinha mas com rádio soube que milton nascimento tinha sido censurado e minha mãe resolve me mudar de escola depois de uma pequena "rebelião" pessoal e uma repetência escolar por desgosto. a outra escola, as pessoas, as redações que chamaram a atenção dos professores, o colega que sabe-se lá me achou capaz de traduzir letras dos rollings stones, elton john, david bowie, a menina de nome alice, a rua com mais árvores, a maria candida, mais parecida com ruas londrinenses, aquela professora hors councors e aquela que me chamava a atenção, e os discos do milton. sóis de primavera sob a cabeça de um guri.

eles deixaram a minha vida menos cinza. penso assim.

deixando de querer ser jogador de futebol, engenheiro agrônomo, reparei nas letras dos discos dele.dava para ser diplomata, jornalista, cineasta e letrista dele se ele precisasse. estávamos aí

olhando para ela e para uma menina de outra classe de saia curta do uniforme, a cidade foi ficando menos cinza. fui ficando mais e mais silencioso é verdade, por vários motivos. devorando novas e comendo as poucas palavras que conhecia e que ainda não davam uma letra para um disco do milton.

então minha escrita é interesseira e platônica.

letrista do milton não sei mas de alguma forma espero que ela saiba que escrevo para que ela ainda me leia e certifique-se dos ramalhetes que monto, para que isso, seja uma primavera permanente.





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