sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Suave coisa nenhuma

a campainha do carro de sorvete soa longe, vai demorar para chegar por aqui. eu tenho uns doze anos e mexo as moedas que tenho, trocando- as de mão.

ouço uma música no rádio do vizinho. a menina da casa, que não conversa comigo cantarola junto desafinada. eu tenho uns treze anos.

a mão dela é macia, nunca vou esquecer. fico brincando com os dedos dela enquanto ela fala comigo sobre pôr do sol e poemas. eu tenho uns dezenove, ela menos e vai sumir logo do meu campo de visão.

a bebida fez efeito antes do esperado. na rua da cidade estrangeira minha boca tem gosto de sangue. a mulher inerte na cama aguarda um sorriso para sobreviver. eu tenho uns vinte e cinco e vou correr de onde estou para um poço mais fundo.

o carrinho da memória e sua bandinha soam sempre sob o sol. eu tenho muitos anos e muitos nomes em minha história. alguns deles apareceram, bateram em minha porta. querem dançar comigo, eu aceito. escrevo felicidades em bilhetes imaginários e espero as próximas danças.

quando abro os olhos um par de olhos claros me indaga: você não estudou no casemiro ? a música que eu dancei com ela me abraça.


Nenhum comentário: